Pousada da Serra da Estrela
Não sou saudosista, mas o passado anda de olho em mim. Já aqui escrevi sobre a minha relação com a Serra da Estrela, num texto sobre as Casas das Penhas Douradas onde contei ter descoberto uma serra que desconhecia, mesmo por lá tendo vivido durante quatro anos. Agora voltei a um lugar onde fui feliz, seja lá o que isso for: o antigo sanatório dos ferroviários, a meio caminho entre a Covilhã e as Penhas da Saúde. E quem diz antigo sanatório diz atual Pousada da Serra da Estrela.
Nunca saberei ao certo quantas tardes e madrugadas por ali passei. Eu e milhares de estudantes da Universidade da Beira Interior, românticos inveterados que subíamos aos 1.300 metros de altitude só para trocar um beijar ou fumar a natureza. Sei também que nada disso interessa ao leitor. Coisas de miúdos, dirão alguns. Sim, mas não só. Além dos estudantes, também a maioria dos habitantes da região e um sem número de portugueses que subiram (ou desceram) à torre pela Covilhã criaram ao longo dos anos uma certa relação de intimidade com este edifício. Afinal, faz parte da paisagem desde o início do século XX.
Um edifício da autoria do multifacetado Cotttinelli Telmo, à data um jovem arquiteto e realizador que acabaria por projetar algumas das maiores obras do Estado Novo, entre elas o afinadinho A Canção de Lisboa. Construído como sanatório para os funcionários dos caminhos-de-ferro, recebeu os últimos doentes na década de setenta e serviu posteriormente como alojamento temporário para os “retornados”. E depois? Depois, depois veio o abandono, a natureza a comer à pedra, fotógrafos amadores atraídos pela aura de mistério que a decadência sempre empresta e, como não poderia deixar de ser, um sem número de boatos que lhe deram fama de local assombrado.
Obras com esta riqueza arquitetónica não podem, contudo, ficar eternamente votadas ao abandono – podem, podem, em Portugal podem – e, por isso, há muito se falava na reconversão para hotel. A verdade é que os anos passavam-se e o dia nunca mais chegava, de tal forma que quando o Grupo Pestana anunciou a abertura da unidade para o dia 1 de abril de 2014 muitos perguntaram-se se não seria uma partida do “dia das mentiras”. Não foi. Outros temiam que esta fosse mais uma pousada sem chama, com serviços padronizados e sem qualquer respeito pela envolvência e tradições locais. Não é. Tem alma e vida próprias – salvo seja.
O facto do projeto da Pousada da Serra da Estrela ter sido entregue a Eduardo Souto de Moura mostra o cuidado empregue na reconversão, ele que acrescentou o seu cunho pessoal e um toque de contemporaneidade mas fez questão de respeitar o trabalho original de Cottinelli Telmo, nomeadamente as inúmeras colunas em granito ou o chão do restaurante. Elementos que sobreviveram aos anos de abandono.
“Não tenho palavras. Está ainda melhor do que no nosso tempo”, oiço uma senhora comentar aquando da minha visita. Estava com uma amiga, ambas septuagenárias, e preparavam-se para ser entrevistadas para a televisão, numa reportagem com trabalhadores do antigo sanatório.
Não sei como seria no tempo deles, sei em que estado estava no meu. A decadência pode ser muito poética e fotogénica, mas a realidade é outra história, e não há nada como encarar o futuro de cara lavada. Com 92 quartos, piscina exterior, piscina interior e spa com várias salas de tratamento, relaxamento e ginásio, a verdade é que apesar de alguma desconfiança inicial, a Pousada da Serra da Estrela tornou-se em menos de um ano na referência maior da região. O porto de abrigo para todos aqueles que queiram subir à serra no inverno, mas também um ponto de partida ideal para explorar os seus caminhos e encantos primaveris, algo que os estrangeiros há muito descobriram e a que os portugueses parecem ainda resistir.
Nem todas as casas podem (nem devem) ser unidades hoteleiras, mas que todos os edifícios abandonados por onde passei tenham a capacidade para renascer desta forma.
Como é a Pousada da Serra da Estrela?
“O facto do projeto da Pousada da Serra da Estrela ter sido entregue a Eduardo Souto de Moura mostra o cuidado empregue na reconversão, ele que acrescentou o seu cunho pessoal e um toque de contemporaneidade.” João Ferreira Oliveira
Localização
Situado na Estrada Nacional 339, a meio caminho entre a Covilhã e as Penhas da Saúde, a Pousada da Serra da Estrela tem na sua localização outra das suas características maiores. A vista para a cidade, a proximidade da serra e a relação umbilical com a natureza são únicas em Portugal. Além do ar puro.
Morada: Estrada Nacional 339 – Penhas da Saúde, 6200-111 Covilhã
Quartos
A Pousada da Serra da Estrela tem 92 quartos (12 suites) espaçosos, confortáveis e, muitos deles, com varanda e vista panorâmica.
Atmosfera
Se o ar é puro, a atmosfera da Pousada da Serra da Estrela é descontraída e o ambiente acolhedor. Algo que poderia não ser expectável num edifício de grandes dimensões e em que a pedra é o elemento dominante. Especial referência para o restaurante que funciona como uma espécie de sala de visitas. – um espaço onde há alguns pratos mais internacionais mas onde os sabores serranos são a estrela. Os queijos, as carnes e os enchidos – está tudo no prato.
Pequeno-almoço (café da manhã)
Um pequeno-almoço buffet, completo e variado, que tem a particularidade de ser serviço na sala de refeições principal da Pousada da Serra da Estrela, emprestando assim um encanto especial à primeira refeição do dia.
Conclusão
- Pontos fortes: A vista, a serra, a história e riqueza arquitetónica do edifício.
- Pontos fracos: O facto de estar integrado nas Pousadas de Portugal retira-lhe, apesar de tudo, algum charme que uma pequena cadeia hoteleira poderia emprestar.
- Em resumo: O ponto de partida ideal para conhecer a Serra, de verão ou de inverno.
- Ideal para: Casais e famílias, não só durante o inverno mas durante todo o ano.
- Preço: desde 99€ duplo · Ver preços
- Data da estadia: fev. 2013