Grande Hotel de Paris
A rua é estreita, por vezes chegou-me a parecer, até, escura e triste. Mas é um ponto de passagem obrigatório na ligação entre a Praça da Liberdade e as Praças Guilherme Gomes Fernandes e Carlos Alberto, dois pontos fundamentais da cidade do Porto. Perdi a conta ao número de vezes que já tinha subido e descido a Rua da Fábrica, e também não me lembro há quanto tempo havia reparado naquele edifício que se destaca dos demais, exibindo um porte apalaçado. Já tinha, também, espreitado há muito a escadaria de mármore e visto o tapete vermelho que a cobre, a invocar elites e glamour. Mas foi só quando conheci por dentro o Grande Hotel de Paris que percebi a real dimensão do passeio pela história que as suas paredes nos oferecem.
O Grande Hotel de Paris é o hotel mais antigo da cidade do Porto. Inaugurou em 1877, o mesmo ano da ponte Dona Maria II. Durante o percurso que atravessa três séculos distintos assistiu, naturalmente, a altos e baixos – a pior fase terá sido em 1989, ano em que foi despromovido para residencial -, mas está agora de novo cheio de fulgor, a provar que merece estar listado nos lugares de referência dos alojamentos do Porto.
É um hotel cheio de recantos, o Grande Hotel de Paris. Como o patamar do gramofone ou a biblioteca com títulos em muitas línguas dignos de alfarrabistas e muitos vestígios de bookcrossing. Cantos e recantos que conduzem a cada um dos 42 quartos, com vista para a Rua da Fábrica através de imponentes janelas envidraçadas e longos reposteiros, ou para a Torre dos Clérigos e o morro da Sé. E depois há as escadarias interiores, o pátio exterior, as janelas que dão para corredores à primeira vista labirínticos.
Apesar disso, sentimos estar numa casa de família, permitindo-nos espreitar para retratos antigos e objetos de outras épocas. Como o piano, que abrilhantou os populares saraus de quinta-feira à noite, ou o PBX onde outrora se recebiam chamadas e reservas. Foi como me senti. Como se tivesse chegado à casa de um bisavô, de um parente afastado que foi tentando acompanhar a modernidade, que até foi pioneiro em instalar a água quente e fria, mas que, nos anos 60, preferiu “destruir” uma bonita clarabóia para poder oferecer um serviço de elevador.
O que mais me fascinou no hotel foi andar pelos corredores e encontrar os bilhetes de Eça de Queiroz para a sua amada Maria Emília (foi no Grande Hotel de Paris que o autor se alojou e era de lá que se correspondia com a mulher que viria a ser sua esposa). Ou então encontrar a primeira página que ali desenhou o caricaturista Bordallo Pinheiro, precursor do cartaz artístico, para oferecer ao jornal “Folha Nova”. Ou, ainda, perceber que foi naqueles corredores que se reconciliaram amigos como Camilo Castelo Branco e Guerra Junqueiro, numa reaproximação patrocinada pelo médico de Camilo, Ricardo Jorge.
Porquê tantos nomes de vulto das letras portuguesas entre os hóspedes? A ligação à literatura e aos livros é umbilical, nasceu com o hotel. Ou não fossem alguns dos seus fundadores, como Ernesto Cardron e Mathieux Lugan, os proprietários da Livraria Internacional Ernesto Chardron, hoje a famosa Livraria Lello. É uma sensação entusiasmante: a de calcorrear os mesmos corredores que os vultos da literatura e da história de Portugal.
Como é o Grande Hotel de Paris?
“A abrir as portas desde 1877, merece o epíteto de hotel mais antigo do Porto. Viveu tempos glórios e outros nem por isso. A recente reclassificação para três estrelas veio ajudá-lo a recuperar o seu lugar na História.” Luísa Pinto
Localização
Entre a Praça da Liberdade e a Praça Guilherme Gomes Fernandes, nos números 27-29 da Rua da Fábrica, o Grande Hotel de Paris tem um localização privilegiada que deixa o hóspede perto de tudo. Central, com boas acessibilidades aos transportes públicos, fica a dois passos de São Bento (onde se pode apanhar metros e comboios) e da Avenida dos Aliados, e paredes meias com a zona das Galerias de Paris, um dos quarteirões mais dinâmicos do Porto em termos de restauração e diversão noturna.
Morada: Rua da Fábrica 27/29, 4050-247 Porto
Quartos
São 42 quartos, espalhados pelos três andares do edifício, todos da mesma tipologia – duplos, com cama de casal ou twin. Há alguns mais espaçosos que acolhem sem dificuldade uma cama extra ou um berço. Fiquei num quarto twin, no segundo andar, com duas gigantescas janelas e uma típica varanda para a rua da Fábrica. Temi o pior, em termos de barulho – conheço a movida que a altas horas da noite circula por ali. Numa estadia à quarta-feira não chegou a incomodar, mas acredito que ao fim de semana possa ser um problema para os sonos mais leves.
Os quartos são arejados e limpos. A casa de banho é de traça antiga e completamente funcional. Os amenities disponibilizados são básicos – apenas gel de banho – mas o tipo de almofadas disponíveis merece um menu exclusivo. Há quatro tipos (almofada lombar, para dormir de costas, dormir de lado e para dormir de barriga) à vontade do freguês.
Atmosfera
Nota-se que é um espaço antigo, mas isso não é defeito, nem feitio. É mesmo história. Por momentos parece que estamos a passear num museu, tal o número de peças de coleção expostas. Mas depois reparamos que estamos a calcorrear um lugar vivido, que está a ser paulatinamente recuperado e sempre respeitado. É procurado maioritariamente por franceses (será o chamariz de ter o nome da capital francesa), mas também por portugueses e brasileiros.
Pequeno-almoço (café da manhã)
É um dos pontos fortes do Grande Hotel de Paris, com o café da manhã a ser servido numa sala ampla e luminosa que mantém a traça original e o estilo Belle Epóque, e onde abunda a oferta, superando as expectativas para um hotel de três estrelas. Não é propriamente a variedade que surpreende – não há, por exemplo, muitos tipos de pão à escolha – mas o facto de superar o básico de um pequeno-almoço continental (leite, cereais, salada de frutas, sumo, café e chá) e até mesmo o anglo-saxónico (também tem ovos, tomates, bacon). Na mesa do buffet também havia tortilhas e quiches e, na mesa dos doces, fui surpreendida com um bolo-rei.
Conclusão
- Pontos fortes: a localização, o pequeno-almoço, a simpatia no atendimento.
- Pontos fracos: a falta de estacionamento pode ser um problema; só está disponível nos parques públicos, e custa 17€ por 24h.
- Em resumo: recomendável para quem quer conhecer a cidade do Porto a ter a sensação que está a viver a sua história.
- Ideal para: casais, homens de negócio (há Wi-fi disponível e mesas de trabalho em todos os quartos do hotel).
- Preço: desde 40€ duplo · Ver preços
- Data da estadia: jan. 2014