Casa do Visconde
Thomas Young é inglês e a mulher, Clarisse, é brasileira. Conheceram-se no mundo dos negócios a trabalhar numa corretora. Hoje são um casal, têm filhos, são ambos funcionários de uma multinacional na área da consultadoria e vivem na Arábia Saudita. Como consultores de investimentos estão habituados a olhar para folhas de cálculos para tomar decisões e sabem que o risco faz parte do mundo dos negócios. Foi um risco quando, ao procurarem espaços onde podiam alocar algum investimento, se depararam com uma casa do final do século XIX à venda no Alcaide, uma aldeia que nenhum dos dois conhecia. A história da casa, a imponência do edifício e o potencial da aldeia foi o que os levou a arriscar.
O susto veio logo de seguida: abriram portas quando a pandemia de Covid estourou. Mas já recuperaram do susto. E conseguiram convencer Lisa, a mãe de Clarisse, a deixar a Foz de Iguaçu natal para estar no Alcaide, a receber os hóspedes. “Sempre vivi em cidades grandes, e com calor. Estava habituada a sair da porta de casa e ter sempre muita gente a passar, a ter tudo o que precisava do outro lado da rua. “Vir para uma aldeia pequenina no meio da serra foi um grande desafio. “Aqui não se via gente a passar. Sentia-me meio perdida”, confessou. Um desafio que o Míscaros – Festival do Cogumelo ajudou a ultrapassar.
“Aí sim, vi o potencial desta aldeia. Estou rendida ao Alcaide”, confessa. O festival acontece todos os anos em novembro. Mas no resto do ano, sobretudo no verão, também há muitos eventos organizados pela diligente Liga dos Amigos do Alcaide, uma associação cultural sem fins lucrativos. A Casa do Visconde fica numa das ruas centrais da aldeia, e a data inscrita na frontaria da porta, numa laje de granito, atesta o seu valor histórico: 1861.
Nós chegamos ao Alcaide depois do Míscaros – Festival dos Cogumelo, mas ainda a tempo de ver a aldeia enfeitada, de ver a arrumar as últimas bancas de algumas tascas e de adivinhar que a festa foi rija e animada. Não fomos para o Festival dos Cogumelos, fomos para conhecer o quotidiano daquela que é uma das mais antigas e bonitas aldeias da serra da Gardunha e do concelho do Fundão. Uma aldeia cheia de vida, todos os dias do ano.
O Alcaide fica a escassos seis quilómetros da cidade do Fundão, na encosta norte da serra da Gardunha e integra a rede das Aldeias de Montanha. E entre os principais argumentos que tornam a visita à aldeia quase obrigatória estão a natureza exuberante que a rodeia, mas também a importância que tiveram, na política e na democracia, alguns dos seus ilustres habitantes.
O Alcaide foi terra natal de gente importante como João Franco, primeiro-ministro nomeado pelo rei D. Carlos para tentar pôr ordem no país ou ainda Francisco Cunha Leal, um estadista que iniciou a vida política no Parlamento de Sidónio Pais mas que assistiu depois à ascensão de Salazar, em 1928, tornando-se um firme opositor ao regime.
A Casa de Cunha Leal é um imponente casarão situado bem perto da igreja matriz e que foi recuperado pela Junta e hoje alberga um restaurante capitaneado por dois jovens chefs – Roberto Lopes e Ana Batista. Na rua que vai da Praça para a Igreja está a casa que era de João Franco e hoje é dos seus descendentes. Já o Visconde do Alcaide, Alberto Carlos da Costa Falcão, era um amigo de João Franco, e a casa de um tem muitas semelhanças com a casa do outro – as fachadas neogóticas inspiradas em Paris sugerem-no. A documentada amizade que o visconde teve com o Cônsul de Paris, Eça de Queiroz, confirma-o.
O Visconde não teve filhos, mas os seus familiares herdeiros – entre eles Lourenço de Almeida, bisneto do Visconde – contam toda a sua história, num documento que os novos donos da casa publicaram no seu site. Graças a Thomas e Clarisse, a Casa do Visconde é agora o hotel que faltava à aldeia, oferecendo aos visitantes 12 quartos acolhedores.
A Casa do Visconde é uma presença notória no núcleo principal da aldeia, sobressaindo entre o casario que compõe o aglomerado rural. Os proprietários tiveram a preocupação de respeitar a traça do edifício, reconvertendo antigos armazéns agrícolas e a casa do caseiro em várias unidades de alojamento. E no local da antiga cavalariça nasceu um espaço de refeições e convívio, onde é servido o pequeno almoço. No rés-do-chão da casa principal, as antigas lojas foram transformadas em pequenos estúdios, em que a suite tem acoplada uma zona de kitchenette e uma sala de estar e refeições. Na antiga adega, onde ainda se vislumbra o antigo lagar de vinho foi criado um amplo espaço para reuniões e confraternizações.
A entrada na Casa do Visconde faz-se por uma imponente porta de ferro na Rua do Espírito Santo que serve o logradouro por onde se desenha toda a distribuição da casa e dos alojamentos. É, também, o logradouro que pode servir de refúgio de tranquilidade quando o bulício toma conta da aldeia nos dias do Festival. Esses são os dias preferidos de Lisa. Mas também ela já se habituou à tranquilidade.
Veja também o artigo sobre onde dormir no Míscaros – Festival do Cogumelo, bem como a experiência na belíssima casa de campo Cerca Design House.
Como é a Casa do Visconde
É um refúgio de tranquilidade no bulicio que toma conta da aldeia nos dias de Festival. E são um nicho de comodidade e conforto durante todos os dias do ano.
Localização
O Alcaide fica a seis quilómetros do Fundão, muito bem servido por acessibilidades rodoviárias e ferroviárias (o apeadeiro do Alcaide, na Linha da Beira Alta, ainda serve de paragem a quatro comboios por dia para a Covilhã e outros quatro para Castelo Branco). A Casa do Visconde fica na Rua Espírito Santo, em pleno coração da aldeia, muito perto da praça central.
Quartos
A imponente Casa do Visconde oferece 12 alojamentos diferenciados, sendo que entre a oferta há quartos triplos e também familiares, com possibilidade de receber até quatro pessoas. Estes últimos são constituídos por kitchenette e dispõem de um sofá na zona de estar. Têm também terraço ou varanda com vista para o logradouro onde pontua um bem cuidado jardim. Os quartos são decorados com sobriedade e requinte (sem ostentação) e as camas oferecem um indiscutível conforto, com colchões de reconhecível qualidade.
Atmosfera
Uma atmosfera acolhedora, onde a história da aldeia e do país é servida de mão dada com o conforto e a simplicidade. Não há nada a mais, nem a menos. Tudo é sóbrio e tranquilo. E confortável e funcional.
Pequeno-almoço
O pequeno-almoço é opcional, pode preferir estar em autonomia e prepará-lo (caso fique num dos quartos servidos por kitchenette) ou então ir a um dos cafezinhos da aldeia. Mas, se optar por não incluir o pequeno-almoço, saiba que está a dispensar uma refeição continental bem guarnecida e de qualidade. Para além do café, chá ou leite, há sumos variados e granola à disposição, assim como queijo, fiambre, manteiga, mel e vários doces caseiros. Também não falta a fruta laminada e alguma pastelaria (croissants incluídos) a que é difícil resistir, mesmo havendo vários tipos de pão à disposição do hóspede.
Casa do Visconde
- Pontos Fortes: A localização, bem no centro da aldeia, e o conforto dos quartos, bem climatizados e com excelentes colchões.
- Pontos Fracos: Não chega a ser um ponto fraco, mas o estacionamento não pode ser feito dentro de muros, mas sim nas estreitas ruas da aldeia. A opção, compreensível e louvável, foi a de deixar o logradouro disponível para usufruto dos hospedes e não aparcamento de viaturas.
- Conclusão: Perfeita para ser base na aldeia do Alcaide mas também como ponto de partida (e chegada) para todas as visitas à serra da Gardunha.
- Ideal para: Um casal, uma família, um pequeno grupo de amigos.
- Preços: A partir de 60€ por noite.
- Data da estadia: novembro 2023.