Lugar das Letras
Quem vem pela estrada acima em direção ao centro da aldeia de Gouvães, uma freguesia de Sabrosa que é toda ela um miradouro privilegiado para perder o olhar (e a respiração) nas socalcos durienses, quase não dá por ela. O antigo edifício da escola primária que procurávamos, e que se tinha transformado num empreendimento turístico, não se vê à primeira da rua. Mas não tem de enganar.
Estamos a chegar ao centro da aldeia e a placa confirma que estamos bem localizados – o Lugar das Letras é aqui, basta virar à direita e andar 100 metros e já o vemos. Ali está ele, imaculadamente branco, porta vermelha, traça original da arquitectura que se multiplicou no país no tempo da velha senhora.
Não conheço ninguém que reserve um quarto num hotel, ou uma casa para um fim de semana ou uma férias mais ou menos prolongadas, que não procure imagens e referências. Mesmo quem gosta de surpresas, como eu, considera que há coisas em que não quer ser surpreendida. Só se for pela positiva. Pois eu não sou diferente, e já tinha procurado imagens do Lugar das Letras e deixado que elas me convencessem. Mas continuava a não perceber. Como é que aquele edifício térreo e airoso pode albergar as imagens das suites que espreitei antes de sair de casa, e ainda uma cozinha toda equipada (e que nós, que viajávamos com um bebé tínhamos eleito como fundamental) e aqueles espaços de usufruto comum, que têm salão de jogos, poltronas confortáveis, lareiras acolhedoras e prateleiras com livros? Fácil. A escola propriamente dita, não é tecto de quartos. Estes estão acoplados num outro edifício que não precisa de se impor na paisagem para existir. Estava dado o mote para a primeira de muitas lições que iria retirar da estadia da Escola.
No Lugar das Letras tudo foi pensado ao pormenor para receber bem e acolher melhor. E para deixar o hóspede perceber que é no que parece simples que reside o segredo maior. Os espaços são amplos, a decoração é minimal nos objectos e generosa no conforto, a luz entra a rodos, a paisagem exterior é a rainha da casa. As opções são tão simples que parecem naturais, como se, de facto, não pudessem ser de outra maneira. O problema é que podiam. Felizmente não são.
Mal passamos a porta principal da velha escola (e depois de já nos termos deixado enlevar pelos aprazíveis espaços exteriores, onde, por exemplo, pontua uma velha bicicleta que foi convertida em alegre floreira) damos logo com o quadro de lousa e as carteiras da escola. A giz, a mensagem de boas vindas. As orelhas de burro, que no passado eram sinal de castigo, são hoje sinal de humor e brincadeira. Perfeitas para as crianças, que logo começaram a brincar.
Mas houve mais, muito mais, na ainda assim curta estadia no Lugar das Letras, que merece menção por significar memória futura. Primeiro, a qualidade dos materiais e a simplicidade da decoração: linhas modernas a contrastar com os objectos antigos, todos eles ligados ao imaginário da infância e da aprendizagem, recuperados e expostos de forma criativa. Exemplo: uma pilha de livros pode muito bem ser o pé de um candeeiro e um compasso tamanho gigante também. Segundo, o grau de equipamento da casa e da cozinha: nenhuma cozinheira sentirá falta de nada (isto sem pensar nas que dependem da Bimby, já que a casa está equipada, mas não chega a tanto), e também há lavandaria para usar nas estadias mais longas. Terceiro, mas não por último, o Lugar das Letras tem o melhor e mais importante de tudo, e não estou a falar da paisagem (soberba, patrimonial, poética). A casa tem um surpreendente calor humano.
A Estrela não é só a funcionária que nos abre a porta, nos mostra a casa, e nos faz as refeições a pedido. A Estrela é uma daquelas boas conversadoras a quem apetece convidar para puxar uma cadeira e sentar-se à mesa para connosco beber um copo de vinho (e que bom, o vinho!). E é das que sabe respeitar o espaço dos hóspedes e as dinâmicas das famílias ou dos grupos de amigos que nela se reúnem, como era o meu caso. Se o Lugar das Letras foi uma escola no passado, no presente é uma escola onde se aprende que a vida é boa e deve ser apreciada. E ainda nos faltou experimentar a piscina e o salão de jogos – porque o tempo, o da meteorologia e o do relógio não chegaram para tudo. Podemos não sair dos bancos desta escola?
Como é o Lugar das Letras?
“Já não é uma escola primária, mas nela ainda se aprende (e se vive) tudo o que é essencial num empreendimento turístico: qualidade, bom gosto, simpatia e paisagem.”Luísa Pinto
Localização
O Lugar das Letras fica no centro da freguesia de Gouvães do Douro, no concelho de Sabrosa. Tem vistas privilegiadas para os vales esculpidos a socalcos e para as pitorescas aldeias de Provesende e Casal de Loivos. Fica a dez minutos de carro do Pinhão, se tanto.
Morada: Praça de Gouvães, Gouvães do Douro
Quartos
Com apenas quatro quartos – que podem ser reservados individualmente, fora da época alta – o Lugar das Letras foi principalmente pensado para acolher pequenas famílias e ou grupos de amigos. Com dois quartos no rés-do chão e outros dois no primeiro andar, todos tem áreas generosas e casa de banho incluída. Um dos quartos – o do segundo andar, e o único que não tem paisagem desafogada – foi pensado para acolher as crianças. No Quarto do Recreio as camas são individuais, estão munidas de gavetões-cama que ampliam a capacidade do Lugar das Letras.
Atmosfera
Não há que esconder que é a paisagem duriense o melhor cartão de visita de quem visita a aldeia de Gouvães e o Lugar das Letras. A fruição da paisagem é, pois, exponenciada pelos janelões dos quartos e da sala, e a organização do espaço foi feita em função das linhas do horizonte. Mas não é preciso estar sempre a olhar para fora da janela para sentir que há boas razões para estar no Lugar das Letras. Em qualquer altura do ano.
Pequeno-almoço (café da manhã)
Servido diariamente pela diligente Estrela, faz-se de sumo de laranja acabada de espremer, pão fresco e compotas caseiras. E bolo, e café, e fatiados, e fruta. Tudo o que um pequeno almoço continental deve ter, com a mais valia dos produtos serem frescos e da região.
Conclusão
- Pontos fortes: o conforto, a privacidade, a envolvência da paisagem e a simpatia e a prontidão da Estrela.
- Pontos fracos: as encostas e os socalcos estão mesmo a pedir o Rio Douro; ele sente-se e pressente-se mas não se vê. Para ser perfeito só faltava mudar-lhe o curso para que ele pudesse ser avistado a serpentear, lá em baixo.
- Em resumo: Perfeito tanto para uma estadia curta, como um fim de semana de repouso em família como para base para uma ou mais semanas de intensa actividade na região.
- Ideal para: Casais, com e sem filhos, grupos de amigos.
- Preço: desde 80€ duplo · Ver preços
- Data da estadia: fev. 2015